ITAIPU: A OBRA DO SÉCULO XX.



Félix Gerardo Ibarra Prieto

Segundo o ex-diplomata paraguaio Luis Maria Ramírez Boettner em seu livro de memorias, o primeiro grande passo para se chegar ao “Tratado de Itaipú” foi a “Ata de Foz de Iguaçu” (22 de junho de 1966), uma solução pacífica para acalmar os ânimos criados pelos burocratas e diplomatas de ambos os países por um problema de limite de apenas cinco quilômetros quadrados em Sete quedas. Essa Ata é considerada por ele, como uma grande vitória da diplomacia paraguaia. Resolveu os problemas limítrofes, deixando sob as águas do Paraná as terras requeridas pelos dois paises.

A idéia de Marcondes Ferraz – engenheiro brasileiro do setor energético - era construir uma hidroelétrica num braço do Rio Paraná que pertenceria apenas ao Brasil. Só que a diplomacia paraguaia enviou notas ao governo brasileiro lembrando que os limites daquela área inda não tinham sido resolvidos, totalmente. Antes esse pedido paraguaio o governo brasileiro reagiu com um discurso fora de contexto para um país vizinho, amigo e que se diz pacífico.

Em 1966 o chanceler brasileiro Juracy Magalhães pronunciou o seguinte discurso ante o ministro de Relações Exteriores do Paraguai, Raúl Sapena Pastor dizendo: Um Tratado de limites só pode ser modificado de duas formas: por mútuo acordo ou por meio de uma guerra vitoriosa e, “na lata” pergunta ao seu homólogo. Estaria de acordo, o Paraguai, em levar a cabo uma guerra vitoriosa para mudar o Tratado? Para que vejam a gravidade do problema, daquela época.

Boettner cita quatro elementos para que o Tratado de Itaipú seja possível: 1) a profundidade do rio 2) o desnível que pode gerar eletricidade 3) o mercado de consumo que até hoje é o Brasil e 4) a possibilidade de conseguir financiamento que só o Brasil poderia conseguir, naquele momento. Duas destas possibilidades não dependiam do Paraguai.

Superado estas barreiras, no dia 26 de abril de 1973 se firma em Brasília o “Tratado de Itaipú” entre os chanceleres Sapena Pastor e Mario Gibson Barbosa. Porem, não se pode esquecer que a aproximação começou em 1942 com Getulio Vargas, depois de um longo distanciamento em conseqüência da Guerra Grande (1865-1870)

Segundo consta no livro do autor existem três anexos (A, B e C), este último trata das bases financeiras de Itaipú e todas podem ser modificadas e atualizadas. A última foi em 1986. Ou seja, o problema não é o Tratado e sim alguns pontos do anexo. Administrativamente existe certa independência da usina em relação aos governos nacionais, embora sejam dependentes das entidades ELETROTROBRAS e ANDE.

Ramirez Boettner admite que a falha paraguaia foi não ter procurado criar industrias que possam utilizar a quantidade de eletricidade que lhe pertence. O art. 3° do Tratado disse: As partes contratantes, em igualdade de direitos e obrigações criam a entidade Itaipú e em igualdade de participação de capital. (Até aqui a parte técnica e histórica do Tratado)

Agora vamos ver o que opinam alguns intelectuais e diplomatas dos dois paises, incluso um da Argentina, já que na época este país tentou, por todos os meios, “melar” o negocio: Carlos Escude, criador da “Teoria do Realismo Periférico” me disse o seguinte, depois de uma longa argumentação técnica sobre Itaipú e Yacyretã: “Paraguai tem razão no que se refere a justiça natural, porem em termos de Direito positivo, assinou maus acordos, caindo numa armadilha da que, legalmente, não poderá sair, facilmente”. Também admite que a Argentina não cumpre o que prometeu, com o Tratado de Yacyretã.

Benjamin Fernández Bogado, me disse na sua conclusão: “Brasil pagara um pouco mais, porem não o que deveria. Paraguai não vai se modernizar nem captar investimentos. Não modificará sua matriz energética e seguirá com a política de mutuas acusações, através da imprensa porque é a única forma de negociação que conhece”.

Francisco Teixeira, um ilustríssimo historiador e professor universitário brasileiro também me falou o seguinte: “Nos meios diplomáticos brasileiro há uma grande impaciência com Lugo. Ele insiste em quebrar o contrato, sob alegações falseadas. A possibilidade do “efeito contagio” com a Bolívia, por exemplo, é preocupante. Também a campanha antibrasileira em Assunção, incluindo os maus tratos aos “brasiguaios”.

Cano Radil, político e professor de direito em universidades paraguaias me disse: Lugo é prisioneiro de conseguir, de qualquer forma, um grande resultado com Brasil. O seu governo é fraco e precisa justificar alguma coisa. Brasil deve se comprometer com o desenvolvimento paraguaio porque um vizinho pobre não é um bom negócio.

Por último a opinião de um diplomata que pediu anonimato: os presidentes são péssimos negociadores. Lugo e Lula são exemplos disso. Assumir uma postura maximalista –tudo ou nada- não é bom, embora a imprensa paraguaia goste disso. Do jeito que está não há solução. Deve mudar-se a metodologia. Paraguai vai insistir em vender a terceiros e Brasil em cumprir o Tratado. Ou seja, uma conversa entre “surdos”.

O consumidor brasileiro é alertado pela imprensa que se o Brasil paga mais ao Paraguai, ele também pagará mais pela conta de luz. Acontece que o consumidor não recebe os benefícios do preço com que o governo brasileiro paga ao Paraguai. Alguém fica como intermediário –grandes empresários do sudeste- e ganha muito dinheiro com isso. Segundo ele, seria justo que uma parte desse dinheiro também chegue para o lado paraguaio. Ele também acrescenta, dizendo que na equipe de negociação do Paraguai não tem nenhum diplomata nem representante do setor elétrico ativo. Isso dificulta os trabalhos e os resultados não aparecem.

Minha opinião: Como pensam os Neo-realistas das Relações Internacionais. A cooperação não é impossível, porem se conseguida é difícil de ser mantida. O que era bom para ambos nos anos 60, 70, hoje não é mais. Ademais, creio que não devem ser responsabilizadas, demasiadamente no aspecto negativo, as pessoas que assinaram este Tratado. Era o que dava para fazer naquela época. O Itamaraty foi um grande parceiro do Paraguai para resolver a disputa de limite construindo a usina, hoje é o mesmo que também dificulta a re-negociação, embora seja possível.

O certo é que o Paraguai deve fazer o dever de casa e tentar usar a sua parte se modernizando com indústrias que tenham como fator vulnerável o consumo de energia elétrica. Enquanto isso não acontecer, todos os outros candidatos a presidente, vão usar este caminho para chegar ao poder. Como já disse em outros escritos: O Tratado de Itaipú não é a fonte, nem de longe a solução dos problemas do Paraguai. Mas, pode ajudar.

De qualquer forma, assim como se chegou ao entendimento para sua construção, depois de uma longa negociação, deve se chegar ao entendimento da sua atualização contratual. Não há outro caminho a não ser o dialogo e isso não tem resultados imediatos como quer Lugo.

É uma sociedade, um condomínio. Toda reunião de condomínio sempre termina em brigas, porem há de se tomar uma posição. Ainda mais quando se trata da maior obra de engenharia do século XX.

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