Chile: de Pinochet a Boric.

 

FÉLIX GERARDO IBARRA PRIETO*


Augusto Pinochet e Gabriel Boric 

Não haveria figura humana, social e nem política tão diferente quanto ao General Augusto Pinochet presidente (1974-1990) e, posteriormente, senador vitalício, e Gabriel Boric, ex-líder estudantil, ex-deputado e atual mandatário do país andino. Os atores são bem diferentes, em tempos e contextos diferentes, mas o Chile continua igual, de (1980 a 2022).


A atual constituição chilena foi proclamada no governo militar de Pinochet em 1980, uma referência do “neoliberalismo”, comparado apenas com o governo da primeira-ministra da Inglaterra, Margareth Thatcher (1979-1990). Como podemos ver, eles comandaram seus países ao mesmo tempo durante mais de uma década, os dois saíram no mesmo ano, morreram com a mesma idade e tiveram uma longa vida para sua geração, 90 anos.


Dias atrás a atual primeira-ministra britânica, Liz Truss (líder conservadora) disse que a “Inglaterra só é o que é hoje graças às políticas “neoliberais” de Thatcher (a dama de ferro)”.  Todos sabem que o Chile sempre foi muito elogiado na região e no mundo por suas qualidades democráticas e solidez econômica, principalmente na época pós Pinochet.   


“La Concertación” grupo de partidos de esquerda iniciado em 1990, com Patrício Aylwin, Eduardo Frei, Ricardo Lagos, Michele Bachelet (duas vezes). todos eles deram prosseguimento às políticas previstas sem manobras constitucionais radicais. Sebastian Piñera, também duas vezes presidente, sendo o único de direita nessa lista que começa em 1990, também escolheu o mesmo caminho.


Em trinta e dois anos de plena democracia, sendo vinte e quatro deles com partidos de esquerda, nunca teve necessidade de mudar bruscamente a constituição. Sempre houve em todos os governos reformas pontuais e importantes e assim foi se avançando pouco a pouco. Uma mudança do tipo proposto neste último plebiscito não seria realizada tão facilmente. Embora os protestos de 2019 tenham indicado esse caminho.


Nesse meio termo, veio a pandemia, e no governo estava alguém contrário a essa mudança radical que teve tempo para fazer as manobras e erradicar essa ideia desejada ansiosamente naquele momento. Piñera deu tempo ao tempo e Boric não teve tempo para poder convencer o  povo chileno do contrario e ele (o povo) decidiu, por 62%, que não quer mudar a constituição atual. Eu, pessoalmente não tinha dúvida que isso não aconteceria, o APRUEBO (aceitar a nova proposta constitucional) e que seria vencedor o RECHAZO (rejeição da proposta). Estive um par de vezes no Chile e percebia que as pessoas, de uma forma geral, tinha orgulho do seu pais.


Quais são os problemas da constituição de Pinochet segundo os populistas? Nela o estado não se responsabiliza integralmente e sim subsidiariamente (em parte) pela saúde, educação, seguridade social, não se responsabiliza pelo coletivo e sim com a ideia liberal de “cada um por si mesmo”. Teoricamente ele (Estado) se preocupa muito mais pela iniciativa privada, mercado financeiro e os negócios. Ou seja, alguém tem dúvida do caráter “neoliberal”? Bom, eu não tenho, resta saber se isso é bom ou ruim para a maioria dos chilenos. Também não há dúvidas da desigualdade de renda entre o andar de cima e o andar de baixo.  


Em síntese, a constituição chilena “amarra” que apareça um governante populista (com acara da maioria dos países latinos) . Cada trabalhador pode contribuir com mais ou com menos para se aposentar, cada indivíduo decide seu futuro e não o estado. Para quem se aposentou com menos do que um salário mínimo, o Estado ainda subsidia para completar, se a educação não é boa em algum município do interior do  país, o Estado vai lá e ajuda. Ou seja, “não é como no Brasil, onde a constituição se responsabiliza por tudo e não entrega quase nada ou entrega muito mal” me disse um amigo chileno-brasileiro, profundo conhecedor da realidade dos dois países. 


O certo é que em 24 anos de Social democracia não fizeram mudanças na espinha dorsal da Carta Magna Chilena e assim foi avançando entre os países mais prósperos, com crescimento de quase dois dígitos nas três últimas décadas. Quiçá a Pandemia tenha colocado em evidência alguma deficiência, porém os protestos nas ruas foram bem antes da COVID-19.


Até agora, o resultado concreto dos protestos foi a chegada de um jovem de 35 anos (Gabriel Boric) no poder, cuja popularidade desaba rapidamente, logo entendeu o recado das urnas (rechaço) e já fez mudanças pontuais e importantes no seu gabinete. O Chile se tornou um país conservador e países conservadores não aceitam mudanças radicais de ideólogos aventureiros. 


Os socialistas chilenos se exilaram na Europa de lá trouxeram a melhor da social democracia, ao contrário de outros socialistas que se exilaram na ex (URSS) ou Cuba onde o comunismo “prosperou”  a base da força, milhares de vitimas fatais e perda total da liberdade, pelo menos na extinta União Soviética, em Cuba nem isso.  

Para finalizar, 42 anos depois da atual Constituição e 32 anos depois da saída da Thatcher e Pinochet, Inglaterra e Chile optam por caminhos diferentes (2022). Liz Truss chega ao poder e enaltece o legado da “dama de ferro” e o Chile vai para a esquerda radical querendo esquecer o legado do Pinochet. Truss disse que “a Inglaterra não seria o que é hoje se não fosse a Margaret Thatcher e suas reformas”, será que o mesmo não se pode aplicar ao Chile? É só uma provocação... Calma, hombre!!!!


*mestre e doutor em Relações Internacionais; professor titular do CESA-Unama (2006-2018); coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade da Amazônia (2008-2012); Diretor e fundador da rede Castilla idiomas do Brasil.  

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